Sunday, December 25, 2005

Para onde o mar me levar

Ao sabor das ondas e das marés,
Navegam pedaços de vida,
Fragmentos de mim.
Não tenho rumo ou destino.
Nada, nem ninguém, me espera
Em algum porto desconhecido.
Há, apenas um horizonte longínquo que me chama,
Que me seduz.
Uma vontade de ir mais além,
Mais além no tempo,
No espaço,
Mais além de mim própria.
Ao sabor da ondas e das marés,
Parto sem nada nas mãos,
Parto somente com a certeza
De que vou para onde o mar me levar.

Fins de tarde

O sol esconde-se por detrás de um rosado horizonte
E a pálida lua ergue-se no céu escurecido.
As cores que me coroam neste fim de tarde
Fundem-se e confundem-se num espaço infinito.
Ao longe, ouço palavras que mais não parecem
Do que o suave murmurar do mar
E, à minha beira, toda a Natureza me sorri.
A memória de outros fins de tarde
É-me, assim, trazida às mãos
Pela leve brisa do primeiro dia de Inverno.

Sunday, December 18, 2005

Uma sala, um palco, um mundo...

“- Percebi que é isto mesmo que eu quero!” – Disse-me o Carlos (Carlão para os amigos) numa manhã qualquer do frio mês de Dezembro. As suas palavras e a convicção que saltava do seu olhar fizeram-me andar no tempo e voltar ao primeiro dia do estágio em que dei uma aula.
Lembro-me de tudo como se tivesse acabado de acontecer. Na noite anterior quase não dormi. Os olhos estavam pesados e sonolentos, mas o coração batia acelerado e a alma teimava em não permanecer quieta. E foi, assim, que as vagarosas horas foram passando uma a uma até ao amanhecer. De manhã estava fresco, mas o sol brilhava num céu pintado de um azul forte. Estas sempre foram as minhas manhãs favoritas, mas a partir desse dia… essas manhãs tornaram-se ainda mais bonitas. Quando entrei na sala e todos aqueles rostos curiosos se voltaram para mim, percebi que aquele era e é o meu mundo… o palco onde sempre quis representar, onde sempre quis dar e receber e onde sempre achei que me realizaria. A verdade é que durante um ano – o ano de estágio – não me poderia sentir mais realizada.
Hoje, o meu palco, tal como tantos outros palcos espalhados por Portugal inteiro, tem as cortinas fechadas, contudo, acredito que, mais tarde ou mais cedo, uma brecha se abrirá e eu poderei de novo tornar-me actriz do mundo da língua e da literatura portuguesas.

Tuesday, December 13, 2005

Um momento mágico

Ontem à tarde, ao ouvir na rádio os mestres António Chaínho e Fernando Alvim, atravessei o portal do Tempo e sentei-me, de novo, no TAGV, para os ouvir num concerto dado no último dia do mês de Novembro. Fechei os olhos e, à distância de duas semanas, ainda me sentia lá, nos primeiros bancos da frente. Hoje, o sentimento continua a ser, simplesmente, o mesmo.
Mágico…absolutamente mágico. É apenas assim que consigo descrever aquele momento.
Ignorando o turbilhão de emoções que me iriam assaltar durante o concerto, fui levada até àquela sala por uma terna voz amiga. Quando entrei, a minha alma entrou e sentou-se comigo, mas, quando saí, ela já não era minha. Aos primeiros acordes todos os meus sentidos despertaram e toda a minha alma se sentiu invadida por aquela inquietante beleza. Durante as cerca de duas horas de concerto, senti-me pertencer a outro mundo. A um mundo intenso, profundo e extremamente puro. A um mundo que só eles conseguiram criar e que, naquela magnifica noite, quiseram partilhar comigo e com as restantes pessoas que os foram ver, ouvir e, sobretudo, sentir. Sim, sentir. Pois, se nos despirmos de todas as máscaras do dia-a-dia e de todo o nosso lado mais racional, poderemos, de facto, conhecer o verdadeiro alcance dos sentimentos que se extrapolavam pelos acordes das guitarras. Não é preciso pensar em nada. Basta ir e deixar que toda aquela beleza nos toque. A música é um pouco como a poesia. É preciso abrir o coração e deixar entrar os sentimentos. É preciso saber escutar e reaprender a viver em cada acorde dado. É preciso amar… amarmo-nos a nós próprios, amar o mundo, amar a Vida.
Assim, entre a magia daquele momento, as lágrimas vindas do fundo da alma e um abraço amigo, acabou o concerto. Contudo, os dias foram passando e a música não se calou. Pelo contrário, ela continua e continuará a ecoar dentro de mim.

Saturday, December 10, 2005

O meu anjo...


O meu anjo dorme serenamente
Embalado pelas ondas do mar.
Ao longo do areal, os seus sonhos estendem-se
Por um horizonte de memórias
E a sua alma passeia-se
Por entre gaivotas, conchas e búzios.
Os seus olhos têm a cor das folhas
Que caem no Outono
E os seus cabelos
Lembram a branca neve de Inverno.
As flores da Primavera não são mais belas
Do que o seu rosto
E a lua em noites de Verão
Não é mais doce do que a sua voz.
Serenamente o meu anjo continua a dormir
E, ao longo do areal,
As ondas do mar embalam-no
Por entre gaivotas, conchas e búzios.

(Para alguém que me ensinou a crescer e a ser quem sou. Onde quer que estejas, muito obrigada...avó Quitas)

Olhar é, também, compreender

- A senhora está triste? – Perguntaram-me, um dia destes, quando estava para pagar uma conta numa pastelaria. Terá sido ontem? Não sei. O Tempo tem esta particular beleza de, às vezes, passar muito devagarinho, quase a ponto de nos beijar, e de, outras vezes, passar muito depressa, oferecendo-nos quase uma bofetada no rosto. Se o Tempo não importa, o Onde também não importará. O que é mesmo importante é o facto de terem reparado. Neste mundo em que todos correm de um lado para o outro e em que ninguém repara em ninguém, esta pergunta, naquele lugar e naquele tempo, fez-me parar. E fez-me parar porquê? Interrogar-se-ão vocês. Simplesmente, porque era verdade. A minha alma estava pesada e o meu olhar triste. Um estranho, numa pastelaria qualquer e num dia qualquer, olhou para mim e viu-me, vendo-me também no meu interior.
- Não. – Disse-lhe eu, com uma voz pouco convincente e um sorriso um pouco forçado. Na verdade, inconscientemente, quis-lhe dizer que sim, mas o não acabava por me arranjar uma saída mais fácil, evitando assim outro tipo de perguntas que requeriam uma resposta mais longa, e talvez até mais difícil.
Ao mesmo tempo que me dirigia para o carro, ia pensando no que me tinha acabado de acontecer. Pé ante pé, fui prolongando o meu regresso para poder ter mais tempo para reflectir. É impressionante como uma pergunta tão simples, sincera e inocente nos pode tocar tanto. Na correria louca do dia-a-dia, nunca, ou quase nunca, nos apercebemos de quem passa ou de quem olha para nós. Na verdade, são também poucas as vezes em que olhamos para os outros. Olhar, não no sentido de ver, mas de compreender. Olhar no sentido que Antoine de Saint-Exupéry lhe deu, n’ O Principezinho, ao dizer que “ (…) só se vê bem com o coração. O essencial é invisível aos olhos.”.
Quando cheguei ao carro, após milhares de pensamentos e algumas centenas de passos, já trazia um sorriso sincero no rosto, simplesmente, porque me sentia reconfortada com a ideia de que, apesar das relações entre as pessoas serem cada vez mais impessoais, ainda há gente que se importa … ainda há gente que repara. Com o rosto bem erguido para o céu, lancei ao vento o meu “muito obrigada”.

(23-08-05)

Somente palavras

Não sei mais para onde olhar.
Não sei mais porque continuo a olhar o mar...
Lá ao longe vejo o homem do leme...decidido,
navega para o horizonte sem sentir medo do que vai encontrar,
sem sentir medo do desconhecido.
Lá ao longe vejo o homem do leme...
vejo os sonhos que são os meus,
vejo os castelos construídos de ilusões,
vejo a coragem que perdi...
Não sei mais porque continuo a olhar o mar...
Sei que o homem do leme não mais vai voltar...

(29-06-02)

(Para o Ricardo Jorge...o Homem do Leme que, depois de atravessar muitas tempestades, acabou por regressar)